Alterações na Lei da Nacionalidade: netos e cônjuges de portugueses e filhos de imigrantes são beneficiados
As alterações à Lei da Nacionalidade aprovadas pela Assembleia da República ainda dependem da sanção presidencial e da publicação oficial para entrarem em vigor. Na mesma votação também foi tratado o andamento das alterações referentes aos requisitos aplicáveis aos descendentes de judeus sefarditas.
No último dia 23 de julho, a Assembleia da Republica aprovou diversas modificações na Lei da Nacionalidade (Lei nº 37/81). A aprovação foi feita por voto electrónico, com 144 votos a favor, uma abstenção e 82 votos contra. Por se tratar de alteração de uma lei orgânica, exige a maioria absoluta dos deputados em efectividade para aprovação.
As principais alterações abrandam alguns requisitos até aqui exigidos para os netos e cônjuges de portugueses e para os filhos de imigrantes nascidos em Portugal, bem como concedem o direito à nacionalidade aos nascidos em território ultramarino e tornado independente com o fim da colónias portuguesas, de acordo com certos requisitos.
Em relação aos descendentes de judeus sefarditas, a Assembleia da República deixou de apreciar as propostas apresentadas até aqui e remeteu ao Governo do Primeiro-ministro António Costa a competência para alterar o Decreto-Lei 237-A/2006, que regulamenta a Lei da Nacionalidade e estabelece os requisitos para a naturalização de descendentes de judeus sefarditas portugueses.
A seguir apresentamos, em resumo, as diversas aprovações.
NETOS DE PORTUGUESES
Os netos de portugueses passam a ter, a partir da entrada em vigor da legislação aprovada, uma maior facilidade para comprovar o vínculo efectivo com Portugal, um dos requisitos impostos a estes requerentes da nacionalidade portuguesa.
A alteração in casu é especialmente benéfica aos netos de portugueses nascidos no Brasil e nos demais países de língua portuguesa, como Angola e Moçambique, também ex-colónias de Portugal.
Actualmente, os netos de portugueses devem comprovar, além da sua ascendência portuguesa direta de 2º grau, os seus laços de efectiva ligação à comunidade nacional, ou simplesmente, seu vínculo efectivo com Portugal. Até aqui, o vínculo efectivo com Portugal é comprovado, entre outros meios, através: da residência legal do requerente em Portugal por ao menos 03 anos; de viagens regulares a Portugal, normalmente por mais de 05 anos; de propriedade de imóveis em Portugal; a vinculação a associações portuguesas no estrangeiros, etc.
Contudo, com a alteração aprovada, o requisito do vínculo efectivo com Portugal deverá ser cumprido com a comprovação de que o neto de português tem conhecimento suficiente da língua portuguesa. Este conhecimento é presumido nos casos em que o país de naturalidade do requerente tem a língua portuguesa como língua oficial, tal qual o caso do Brasil, Angola, Moçambique, etc.
Assim, serão requisitos a ascendência portuguesa de 2º grau em linha reta e vínculo efetivo com Portugal, servindo o conhecimento da língua portuguesa como prova de tal vínculo. Aos netos de portugueses que não tenham conhecimento da língua portuguesa, restará buscar os conhecimentos necessários da língua portuguesa.
CÔNJUGES DE PORTUGUESES
As alterações relativas aos direito à nacionalidade portuguesa dos cônjuges de portugueses traz benefícios a muitos. Assim como no caso dos netos de portugueses, se modifica a forma de comprovação do requisito de vínculo efetivo com Portugal, mencionado acima, de forma a facilitar a sua comprovação. Porém, no caso dos cônjuges, esta modificação é feita de forma diferente.
Atualmente, o cônjuge ou pessoa que viva em união de facto com português deve comprovar que o casamento ou a união já dura a mais de 03 anos e também comprovar o vínculo efectivo com Portugal, na forma hoje prevista, ou seja, através da residência legal em Portugal por ao menos 03 anos, de viagens regulares a Portugal, normalmente por mais de 05 anos, de propriedade de imóveis em Portugal, etc.
Com a alteração aprovada, o requisito do vínculo efetivo com Portugal poderá ser cumprido com a comprovação de que o cônjuge de português tem com este filho também português, nato ou naturalizado, ou nos casos em que o casamento ou a união de facto já dure mais de 06 anos.
Desta forma, a lei passará a reconhecer que o casamento com nacional português e a existência de filho também português, ou o casamento ou união de facto com nacional português por mais de 06 anos, comprovam o vínculo efectivo com Portugal.
Outra alteração dispensa a necessidade de ação judicial de reconhecimento da união estável (de facto), nos casos em que o estrangeiro viva em união de facto com nacional português e que tenha filhos comuns de nacionalidade portuguesa.
Ao fim, com as alterações aprovadas, serão 3 situações jurídicas que criarão, para aquela pessoa que é casada ou vive em união estável com português, o direito à nacionalidade portuguesa. São elas:
1- Ter filhos portugueses: A pessoa casada com português e que com este tenha filhos portugueses, natos ou naturalizados, poderá requerer a nacionalidade portuguesa, sem a necessidade de comprovar outros vínculos efetivos com Portugal ou fazer prova relativa à duração do casamento ou da união;
2- Ser casado ou viver em união estável a mais de 03 (três) anos e comprovar o vínculo efetivo com Portugal pelos meios até aqui previstos (residência, viagens regulares, propriedade, etcs);
2- Ser casado ou viver em união estável a mais de 06 (seis) anos, sem a necessidade de comprovar outros vínculos efectivos com Portugal ou fazer prova da existência de filhos portugueses em comum.
Por fim, as alterações referentes aos cônjuges pretendem, principalmente, reconhecer que aqueles que possuem filhos portugueses e cônjuges portugueses já tem o vinculo efetivo necessário com a comunidade portuguesa, inclusive em relação aos que vivem em união estável, uma vez que com as alterações ficam dispensados de propor a ação de reconhecimento de união estável. Quanto aos casados ou em união estável sem filhos, a estes é possível optar pelo prazo de 03 anos ou de 06 anos, comprovando o requisito do vinculo efetivo à comunidade nacional por outros meios, ao primeiro destes casos.
FILHOS DE IMIGRANTES NASCIDOS EM PORTUGAL
A proposta aprovada alarga o direito à nacionalidade portuguesa aos filhos de imigrantes nascidos em território nacional. Passarão a ter o direito os filhos nascidos em Portugal dos imigrantes com residência legal em Portugal a qualquer duração e os filhos nascidos em Portugal dos imigrantes, desde que um de seus progenitores resida, a qualquer título, a ao menos 01 ano em Portugal.
Pela legislação atual, o prazo necessário para a obtenção do direito é de dois anos, sendo que a partir da entrada em vigor do diploma não existirá prazo para os filhos dos imigrantes com residência legal e o prazo passará a ser de apenas 01 ano para os filhos de imigrantes sem residência legal em Portugal.
OUTRAS ALTERAÇÕES
Outras alterações aprovadas na votação dizem respeito ao direito à nacionalidade portuguesa dos descendentes de portugueses e aos estrangeiros que tenham prestado ou sejam chamados a prestar serviços relevantes ao Estado Português ou à comunidade nacional, e dos indivíduos que não conservaram a nacionalidade portuguesa nos termos do artigo 2º do Decreto-Lei n.º 308-A/75, de 24 de junho, por residirem em Portugal há menos de 5 anos em 25 de abril de 1974.
DESCENDENTES DE JUDEUS SEFARDITAS
Em relação aos descendentes de judeus sefarditas, a Assembleia da República deixou de apreciar as propostas apresentadas até aqui e remeteu ao Governo do Primeiro-ministro António Costa a competência para alterar o Decreto-Lei 237-A/2006, que regulamenta a Lei da Nacionalidade e estabelece os requisitos para a naturalização de descendentes de judeus sefarditas portugueses.
Assim, os deputados concederam ao governo o prazo de 90 dias, a contar da publicação das alterações, para apresentar a nova regulamentação dos requisitos aplicáveis aos descendentes de judeus sefarditas que pretendam exercer seu direito à nacionalidade portuguesa.
Segundo o documento, cabe ao governo apresentar uma regulamentação que garanta, no momento do pedido, o cumprimento efetivo de requisitos objetivos comprovados de ligação a Portugal por parte dos descendentes de judeus sefarditas.
Como se viu pelas alterações aplicadas no campo da comprovação do vínculo efectivo a Portugal no caso dos netos e dos cônjuges de portugueses, é possível que o governo regule a questão aplicando a obrigação de comprovar o conhecimento da língua portuguesa, a existência de filhos portugueses, ou mesmo cônjuge português, para os descendentes de sefarditas.
Porém, alguns projetos de alteração da legislação não aprovados pela Assembleia da Republica, previam requisitos mais apertados, que incluíam a necessidade residência legal do requerente em Portugal, por exemplo.
Não obstante, é possível que o governo apresente uma situação ainda mais danosa aos direitos dos descendentes de judeus sefarditas, como no caso proposto pela Ministra da Justiça de Portugal, no qual o direito dos descendentes de sefarditas à nacionalidade portuguesa deixaria de existir em 10 anos.
Contudo, espera-se que este não seja o caminho a ser adoptado pelo governo e que as alterações se restingam a estabelecer requisitos tais quais os aplicáveis aos netos e cônjuges de portugueses.
De toda forma, considerando todas as propostas já apresentadas que impactam o direito em questão, deve-se ressaltar que qualquer mudança no direito à nacionalidade portuguesa dos descendentes de judeus sefarditas somente deve entrar em vigor em janeiro de 2022, de forma a não prejudicar os processos em andamento, uma vez que o trâmite destes processos segue uma forma diferenciada e via de regra mais demorada que os demais processos de nacionalidade portuguesa.
ENTRADA EM VIGOR
As alterações à Lei da Nacionalidade aprovadas pela Assembleia da República ainda dependem da sanção presidencial e da publicação oficial para entrarem em vigor. Além disso, as alterações entram em vigor no dia seguinte ao da sua publicação, sendo que o prazo de 90 dias concedido ao Governo, para a alteração do regulamento referente ao direito à nacionalidade portuguesa dos descendentes de sefarditas, se conta a partir do dia seguinte à publicação.
O presente artigo é uma rápida exposição das principais alterações aprovadas pela Assembleia da República. Outras obrigações e requisitos são aplicáveis aos procedimentos citados.
*Por Philipe Augusto da Silveira Cordeiro, advogado Brasil/Portugal/U.E.